Conhecendo Usagi Yojimbo RPG
Por Luiz Fernando ‘Alface’ Rossafa
Usagi Yojimbo é um rpg PBTA (Powered by the Apocalypse, ou Empoderado pelo Apocalypse) se passa no universo do quadrinho de mesmo nome: um Japão no período Edo, com animais antropomórficos ao invés de humanos.
Nesse jogo você joga com viajantes (e na maioria das vezes excluídos da sociedade) que viajam pelo Japão tentando sobreviver e ganhar a vida com base nos seus ideais e habilidades.
Quem é Usagi? O quadrinho que deu origem a tudo
A série de quadrinhos Usagi Yojimbo começou a ser publicada em 1987 e lança histórias até hoje. Nela temos Miyamoto Usagi, um coelho samurai que perdeu seu mestre durante uma guerra, sendo obrigado a vagar o Japão como um ronin (Samurai sem mestre) sendo muitas vezes empregado como guarda-costas ou auxiliando alguém em perigo na estrada.
As histórias de Usagi são muito baseadas nas grandes histórias de samurai, como a vida de Miyamoto Musashi (do qual ele pega o sobrenome emprestado), os filmes de Akira Kurosawa, o mangá Lobo Solitário e Filhote, entre outras.
O mundo de Usagi também é recheado de lendas, criaturas sobrenaturais e magia. Mas apesar de todas as pessoas terem sido substituídas por animais antropomórficos nos quadrinhos, a arquitetura, as roupas e a cultura tentam ser bem fiéis ao período histórico que emulam.
Usagi também fez participações especiais nos quadrinhos das Tartarugas Ninjas, indo para Nova Iorque, assim como as Tartarugas também foram ao Japão de Edo de Usagi. Quem sabe você não pode fazer o mesmo em seu jogo e usar os personagens em conjunto com as tartarugas?
Usagi Yojimbo, o jogo de RPG
Em Usagi Yojimbo as personagens jogadoras são viajantes, assim como Usagi em seu quadrinho. Você monta sua personagem escolhendo uma espécie (que dará seus atributos iniciais, mas não se preocupe, você pode realocar os pontos depois, então não se sentirá mecanicamente punido pela escolha de espécie), uma cartilha de personagem (que será basicamente sua função, como guarda-costas, ladrão, feiticeiro etc.) e traços de personagem, que oferecem aspectos positivos e negativos para a personagem.
As cartilhas oferecem uma combinação de três fatores: Classe Social (Onde o personagem está na sociedade japonesa, se é um samurai, um sacerdote, um criminoso etc), um movimento único (Uma especialidade da cartilha como Espreitar, Budismo, Trabalho de Equipe) e um movimento de ataque (que diz que tipo de armas você pode usar, como Bushido, que usa armas samurais, Kikotsu, armas de plebeu e Ninjutsu, armas geralmente destinadas a ninjas). Então enquanto o Caçador de Recompensas é um Samurai, com espreitar e Bushido; O Guarda-Costas é um Samurai, com Dairokkan (senso de perigo) e Bushido.
O sistema é o padrão dos PBTAs, com as rolagens acontecendo por meio de movimentos e consistindo em 2d6 + atributo. A diferença principal é que além dos atributos básicos (Iniciativa, Negociação, Integridade e Escolaridade), existem atributos flutuantes (Pontos de História, Pontos de Suporte e Pontos de Contratempo). Os Pontos de História são o que você rola em combate, eles aumentam à medida em que a história avança! Então no começo da história você provavelmente enfrentará oponentes fracos, mas conforme você se aproxima do Clímax, mais poderoso fica! Os Pontos de Suporte servem para você auxiliar as outras personagens, fornecendo bônus em testes que elas farão. Por fim, os Pontos de Contratempo são a forma de “dano” que você recebe, sendo que sempre que você rola dois dados com mesmo número, você deve fazer um teste para não prejudicar seus atributos e eventualmente perder a personagem!
Outra característica interessante do sistema são as armas! Elas são divididas pelo estilo de combate que representam, mas cada uma possui características próprias. Então apesar da Katana, Wakizashi e Ninjato serem espadas, elas possuem habilidades especiais que terão efeitos diferentes no combate!
O Jogos de Usagi Yojimbo RPG
Como dito anteriormente, Usagi é um jogo sobre viagens, personagens que vivem de alguma forma à margem da sociedade tradicional e não possuem uma raiz em algum lugar. Para auxiliar o Mestre de Cerimônias a ambientar sua história, o livro te dá a história do período Edo, em 1605 durante o Shogunato Tokugawa, onde o japão é um país dividido em feudos controlados por Daimyos (senhores de terra) e sob a constante ameaça de uma nova guerra civil!
O livro também te dá um mapa bem interessante do japão, com todas as províncias e locais onde os personagens podem viajar e uma lista das personagens que aparecem em Usagi Yojimbo, desde personagens que apareceram em uma única história, até personagens recorrentes, o que é muito útil para povoar seu mundo!
A maneira como os desafios se apresentam são bem interessantes, visto que os conflitos não precisam ser necessariamente combates. Eles são divididos em Fracos, Fortes e Grandiosos, o que define o quão difícil vai ser superá-los. Os inimigos também são divididos da mesma forma, o que torna criar antagonistas uma tarefa muito simples.
Ele também dá uma estrutura de criar histórias divididas em 3 atos (com as personagens recebendo 1 ponto de história em cada um deles) e para exemplificar traz uma aventura pronta e diversos exemplos de aventura usando essa estrutura!
Por fim, o livro termina com algumas regras opcionais, entre elas a regra de melhoria, uma vez que no sistema as personagens não tem necessidade de evolução, mas se o grupo desejar, existe essa opção.
Considerações finais
Usagi Yojimbo é um jogo excelente para contar histórias no período Edo do japão. As regras são simples, fluidas e te ajudam muito a contar o tipo de história que o livro propõe! Particularmente quem é fã do quadrinho ou das histórias que o inspiraram, vai apreciar muito o jogo!
Por fim, como o livro mesmo coloca, lembre-se sempre dos três pilares da boa narrativa: Aja com justiça, crie em conjunto e divirta-se!
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‘Periféricos’ para RetroPunk RPG
Por Fábio Medeiros
A série Periféricos está no ar pela Amazon Prime, e é inspirada na obra de William Gibson, autor que escreveu a trilogia Sprawl. O primeiro livro da trilogia é Neuromancer, e foi um grande marco para a ficção científica, sendo o título que definiu o gênero cyberpunk. Periféricos tem suas semelhanças com essa trilogia e outros livros de Gibson, e é focada em dois irmãos que vivem num futuro não muito distante, com dificuldades que mesmo hoje conhecemos para viver em nosso mundo. Burton Fisher ganha algum dinheiro fazendo bicos jogando videogames em realidade virtual, e Flynne Fisher tem um emprego numa loja que imprime encomendas com impressora 3D. Ambos moram juntos e cuidam de sua mãe enferma. Muita tecnologia é utilizada pelos personagens e é perceptível no mundo, seja o contato com o mundo virtual, a bicicleta elétrica, o uso de drones e impressoras 3D, ou até mesmo a utilização de uma moto com uma cadeira de rodas por um dos personagens coadjuvantes. A maior parte dessas tecnologias já está presente em nossos dias, mas na série elas ganham uma característica de popularização e massificação da sua utilização que confere uma ideia de avanços tecnológicos em comparação com o nosso mundo atual.
Na Periferia
O nome da série, “Periféricos”, é muito apropriado por ser o nome dado aos aparatos utilizados para que os usuários possam interagir com o computador. Mas também porque pode ser identificado como o termo utilizado para se referir aos grupos marginalizados, que não possuem o acesso aos benefícios promovidos pelo avanço da sociedade. Na série esta discrepância é bem destacada a partir das diferenças entre ricos e pobres. Enquanto a família Fisher sofre para conseguir se manter, alguns grupos têm privilégios que promovem um contraste e destacam os problemas sociais que persistem e se agravam nesse futuro imaginado. Esta característica pode ser levada para um cenário de RPG cyberpunk, apresentando um mundo onde algumas questões não resolvidas são exacerbadas, tornando parte relevante do ambiente. O gênero cyberpunk exala frequentemente essa ambientação, onde a tecnologia está presente de maneira avassaladora, sendo capaz de facilitar e mudar o mundo, mas está acessível para apenas alguns grupos. Enquanto vemos confortos sendo aproveitados por parcela da população, outros têm dificuldade na sua própria existência e não conseguem solucionar por não fazer parte dos privilegiados.
Em Retropunk RPG existe um chamado, um sinal que faz os personagens dos jogadores despertarem, sentindo que há uma falha na organização da sociedade. Isto não precisa ocorrer durante as sessões de jogo, pode fazer parte do histórico do personagem, até porque todos já iniciam sendo considerados Defeitos para o sistema. Encarar uma doença e a impossibilidade do sistema de dar suporte à pessoa é um motivo claro para que um personagem busque de maneira ilícita a sua inclusão (ou da pessoa doente que faz parte da sua vida) entre os cidadãos que teriam acesso aos recursos de saúde.
Puxando os Fios
A busca por igualdade e ambição também podem ser situações que despertam o personagem e o fazem contestar a organização da sociedade. Além disso, é possível pensar que ele estava no lugar e hora errados, e acabou presenciando um evento que deflagra uma situação de corrupção ou algum outro crime. Por esse motivo ele começou a ser caçado por autoridades, ou talvez tenha perdido o acesso a matriz. Desta forma o personagem começa a abrir os olhos para essas discrepâncias durante o jogo, enquanto tenta sobreviver fora do sistema.
O Retropunk é um RPG bem interessante por contar com esse contraste na sua própria forma e conteúdo. Os temas abordados são sempre de rebeldia, de luta contra um sistema pesado e opressor, mas sua estética retrofuturista se apoia em cores fortes e vivas. O cenário é composto por letreiros em neon brilhando ao lado de pessoas em tons de cinza. Enquanto o jogo apresenta um cenário altamente tecnológico, porém decadente em sua moral, com um descaso à vida e à individualidade; o RPG é jogado sem a necessidade de utilização de grandes tecnologias. Nada além de papel, lápis e dados multifacetados é mandatório. Ao mesmo tempo, o foco para o jogo deve sempre ser definido a partir dos interesses dos jogadores, que dialogam sobre o que desejam encontrar e definem os rumos da narrativa a partir de suas decisões. A proposta sobre o tema que será central na narrativa, qual será o ritmo e o que os jogadores esperam experienciar deve ser discutido mesmo antes do jogo iniciar.
O começo e o fim
No início da primeira sessão é recomendado que os jogadores conversem para alinhar suas expectativas, definindo os rumos da história em conjunto, de maneira colaborativa. Este momento também serve para definir o que deve se manter fora da narrativa. Qualquer questão que seja vista como sensível para alguém no grupo, pode ficar demarcada como algo que não deve ser abordado durante o jogo. Com a participação e ciência de todos, os temas indesejados serão mais facilmente evitados durante o jogo. Mesmo que por algum motivo algo surja durante a narrativa, qualquer um dos jogadores podem lembrar a todos que este tópico não deve ser abordado. O Retropunk até mesmo sugere o uso de um kit de ferramentas para segurança para jogos de RPG, um compilado criado por Kienna Shaw e Lauren Bryant-Monk que auxilia na delimitação do que pode ou não ser abordado durante os jogos narrativos, de acordo com cada grupo.
Esse contraste em que os jogadores convivem como iguais, em harmonia e se divertindo ao produzir narrativas que destacam uma sociedade cheia de desigualdades e sofrimento é extremamente relevante para demonstrar que é possível refletir sobre os rumos do nosso mundo, e que dessa forma conseguimos criar outros caminhos. A série Periféricos é uma fonte rica para a introdução de ideias pertinentes ao gênero cyberpunk em jogos de RPG. Muitas delas eu não abordei aqui para que vocês possam assistir sem grandes “spoilers”.
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Apresentando: Sprawlrunners
Por Toca do Coruja
“Esta cidade não te dá escolha. Ou você queima vivo, ou então nunca existiu.”
Surgido nos anos 80, o subgênero de ficção científica Cyberpunk trouxe à tona um futuro “não tão distante”, em que a sujeira e a decadência caminham lado a lado com a tecnologia de ponta.
Longe do futuro grandioso e esperançoso do sci-fi clássico, o cyberpunk traz questionamentos morais graves e uma visão crua, porém muito atual, das relações sociais.
Um fenômeno desse porte não demorou para chegar às mesas de RPG. Sistemas e cenários muito ricos e longevos permeiam o universo RPGista há décadas. É nesse contexto que surge Sprawlrunners.
Longe de querer apresentar um cenário, Sprawlrunners é uma estrutura para você adaptar seu mundo favorito, ou mesmo criar o seu próprio universo. Quer se aventurar no anacrônico mundo de cromo e feitiçaria de Shadowrun? Sprawlrunners te possibilita. Quer adaptar um cenário com psiônicos e experimentos psíquicos, como em Akira, ou com ciborgues com conflitos morais, como em Ghost in the Shell e Battle Angel Alita? Sprawlrunners te possibilita. Possibilita até mesmo seu cenário cyberpunk feijão-com-arroz.
Um dos grandes diferenciais desse suplemento é o uso inventivo das regras de Savage Worlds, que, em vez de apresentar uma miríade de feitiços, poderes chi, ciberimplantes, usa o próprio Progresso das personagens e um punhado de novos sistemas e regras para criar o framework ideal para suas mesas.
Curiosidades
Sprawlrunners usa um sistema não formal de “manifestações” para Vantagens.
Brutamontes pode ser tanto um treinamento marcial quanto um implante de aumento de força. Focado pode ser tanto um sentido de combate místico quanto um Amplificador de Reflexo instalado em sua espinha. O mesmo vale para Rápido, Noção do Perigo, etc.
Nada disso afeta a mecânica do jogo, mas altera como sua personagem é retratada.
Sprawlrunners não usa “dinheiro” nem o sistema de Riqueza, mas os Pontos de Logística, que consistem na capacidade de seu runner conseguir favores, itens com atravessadores, ou algo de seu estoque particular.
Em um mundo onde tudo é descartável, faz muito sentido você contar mais com sua reputação e favores do que com o vil metal.
Sprawlrunners traz duas abordagens para o ciberespaço — o terror dos jogos cyberpunks clássicos: Queima Lenta e Pista Rápida.
Em Queima Lenta, há um conjunto de regras, vantagens e equipamentos para uma incursão mais elaborada no ciberespaço; elaborada, porém com baixa complexidade.
Em Pista Rápida, você vai usar a boa e velha regra de Tarefa Dramática, com alguns pequenos ajustes, para lidar de maneira dinâmica com hackers e GELOs.
Sprawlrunners chega em breve no Brasil, numa parceria Toca do Coruja e RetroPunk.
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Começando a narrar Tiny Dungeon
Por Daniel Tschiedel
Tiny Dungeon é um RPG de fantasia minimalista. Isso quer dizer que ele possui poucas regras, com o objetivo de ser um jogo mais fácil de se entender e de se começar a jogar. Mas não se engane. O fato dele possuir poucas regras não significa que o jogo é incompleto. Ele possui tudo que é necessário para proporcionar aventuras e diversão garantida na mesa.
Apesar dele ser simples, esse artigo visa dar dicas e auxiliar às Mestres que desejam começar a narrar Tiny Dungeon.
Por onde começar
O principal do Tiny Dungeon é a sua mecânica de Testes. Tudo que você precisa saber é que em um Teste a personagem irá rolar normalmente 2d6 e pegar o maior resultado. Se conseguir um 5 ou 6, é um sucesso.
Além disso, se a personagem tiver alguma Vantagem, ela irá rolar 3d6 e se possuir alguma Desvantagem, irá rolar apenas 1d6. Caso em um Teste a personagem tenha Vantagem e Desvantagem, a Desvantagem sempre vence, ou seja, ela vai rolar apenas 1d6 nesse caso.
Pode parecer estranha essa regra da Desvantagem, mas não se preocupe. Pode usá-la conforme definido que funciona perfeitamente na mesa de jogo. Por exemplo, se uma personagem deseja arrombar uma fechadura, a Mestre pode declarar que se trata de uma fechadura simples e por isso o Teste será feito com Vantagem. Porém, digamos que a personagem tem pressa, pois precisa abrir a fechadura para fugir de guardas que estão quase a alcançando. Devido a tensão da situação, isso confere uma Desvantagem a ela. Ou seja, em situações de tensão como essa, mesmo a pessoa mais experiente e preparada pode cometer erros com mais facilidade. Dessa forma, a rolagem com Desvantagem se aplica à cena.
E é basicamente isso que você vai usar no jogo inteiro. Tudo girará em torno de vantagens e desvantagens. O personagem foi derrubado durante o combate? Quem for atacá-lo terá vantagem em seu Teste e ele terá desvantagem ao tentar disparar um arco estando caído no chão. Todos os demais testes descritos no livro, como Teste de Defesa e teste para se esconder, seguem exatamente a regra básica de Testes.
Além da regra de Teste, é necessário compreender as regras de Combate (pgs 11 a 14 do livro), Pontos de Vida e Magia. (pgs, 17 a 21). Não é necessário se preocupar com as regras de Progressão de Personagem e as demais regras opcionais por enquanto.
Inimigos
Os inimigos em Tiny Dungeon são muito simples. Esqueça as fichas complexas cheias de estatísticas e intimidadoras. Os inimigos possuem apenas uma quantidade de Pontos de Vida e uma lista de Traços e/ou Habilidades Especiais.
O livro fornece uma lista com alguns inimigos prontos que você pode usar em sua mesa de jogo, mas ele também fornece uma tabela em sua página 46 que lhe auxilia a criar seus próprios inimigos facilmente. Para isso, basta definir qual seria seu tipo de Ameaça, se é bucha, baixa, média, alta, heroica ou solo. A partir disso, a tabela fornece quantos Pontos de Vida ele tem. Por fim basta dar a ele uma lista de Traços do livro ou então criar suas próprias habilidades.
Criando sua primeira aventura
Tiny Dungeon vem com um excelente Gerador de Aventura na página 87. Você rola 2d6 em várias tabelas de forma a gerar uma frase do tipo Os Aventureiros devem VERBO o SUJEITO no LOCAL, enquanto lidam com um OBSTÁCULO e se opõem ao ANTAGONISTA.
A frase gerada servirá como uma semente de aventura. A partir dela você vai detalhando cada parte, como criar a ficha do antagonista e quem são seus asseclas, gerando o mapa do local onde os jogadores devem ir e assim por diante.
O próprio livro possui um exemplo muito bom de uso desse gerador, detalhando como interpretar a frase gerada. Sugiro a leitura.
Finalizando
Tiny Dungeon possui uma simplicidade que funciona e é exatamente por isso que ele é atualmente meu jogo favorito. Não é necessário se preocupar com cálculos e bônus e nem com valores de atributos.
E caso queira conhecer um pouco mais sobre o Tiny Dungeon antes de comprá-lo, há uma edição gratuita da revista Rolepunkers (baixe aqui) dedicada a ele na seção Downloads do site. Boa leitura.
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A PREPARAÇÃO DO JOGADOR – Parte 2
Como Influenciar Ativamente a Narrativa com sua Personagem
Por Mauricio Fülber
Os Quatro Aspectos Iniciais e o Diário de Progressão
Tudo bem, eu sei, isso tudo pode ser muito interessante na teoria mas, na prática, como isso acontece, você pode estar se perguntando. Primeiramente, entendendo os aspectos que fazem sua personagem ser quem ela é e como esses aspectos podem se desenvolver durante as sessões.
Quando criamos uma personagem existem basicamente quatro pontos gerais que definem quem ela é neste momento inicial da aventura, sendo eles: Origem, Personalidade, Relações e Objetivos.
Esses termos são basicamente autoexplicativos e claro que seria possível destrinchar em muitos outros pontos, mas estes quatro já dão uma noção muito coerente dos principais aspectos de uma personagem. Além disso, é interessante que eles sejam descritos de forma a não exaurir as possibilidades de criação posterior, ainda mais se sua personagem for um iniciante e não alguém profundamente experiente. Fora que, no decorrer das sessões, você perceberá aspectos que farão sentido com sua personagem mas que você não chegou a pensar nesse primeiro momento, sendo possível ir, aos poucos, agregando mais informações a cada um desses quatro pontos apresentados.
E nisso vem a primeira sugestão para iniciar o planejamento de possíveis cenas: tenha espaço para criar e se permita ampliar cada um desses pontos sem medo.
Se você descobrir algo sobre a sua personagem que faz total sentido mas que você ainda não havia percebido, aproveite e agregue ao que você já tem. É importante lembrar que cada situação que vivenciamos nos modifica sutilmente e que cada relação nova que iniciamos ou que desenvolvemos nos abre novas possibilidades.
Por exemplo, a personalidade da sua personagem é bastante introspectiva, mas uma interação com outra personagem do grupo abriu um caminho para que você contasse uma piada e isso pareceu natural, mesmo que isso soe contrário a personalidade inicialmente proposta. Você pode agregar neste ponto que, em relação a esta outra personagem, você tem confiança de ser mais divertida e aberta.
Esse processo pode ser feito, principalmente, com os aspectos de Personalidade, Relações e Objetivos, pois são os com maior potencial de mudança. Ainda assim, dependendo da sua história, a Origem pode também sofrer transformações em caso de novas descobertas e reviravoltas sobre seu passado.
Ou seja, a criação de cenas interessantes se dá no confronto entre esses quatro pontos iniciais em relação à nova situação da personagem como aventureira em um grupo explorando o mundo e na atualização desses aspectos a cada nova interação interpessoal.
Para facilitar seu próprio entendimento de sua personagem, uma sugestão possível é criar um Diário de Progressão, que funciona como um atualizador destes quatro aspectos. Imagine isso como uma segunda Ficha de Personagem, mas apenas com os elementos narrativos, onde você vai atualizando, a cada sessão, aquilo que marcou sua trajetória para ter lembranças de eventos que possam inspirar cenas.
Segue um exemplo do Diário de Progressão para que você possa ter uma ideia: https://drive.google.com/file/d/1KF_4MiLQfTmdRdH0AcI2hwAn0FStc1Ka/view?usp=share_link
O Bloco de Cenas Potenciais
Depois que você tem seu Diário de Progressão preparado e organizado para registrar as mudanças na sua personagem, chegou a hora de começar a se atentar, durante as sessões, a pontos em que você poderá inserir cenas que sejam interessantes para o desenvolvimento dela e anotar para utilizar futuramente. Este compêndio de ideias iremos chamar de Bloco de Cenas Potenciais pois, como apontado anteriormente, não é um roteiro a ser executado e sim uma possibilidade em aberto caso surja a oportunidade.
Estas cenas podem ser organizadas a partir da definição de: Interlocutor, Momento, Local, Descrição e Objetivo.
Interlocutor: com quem você vai se comunicar?
Momento: em qual oportunidade você pretende realizar essa cena?
Local: onde você imagina que isso poderá acontecer?
Descrição: o que você pretende fazer ou conversar nesta cena?
Objetivo: quais os resultados que você espera alcançar com essa cena?
E podem abordar qualquer tipo de cena, seja ela um momento solo da sua personagem, uma interação com outros Personagens Jogadores ou Não-Jogadores, pode ser uma cena de algo que você gostaria de fazer durante o recesso de alguns dias livres entre aventuras que possa vir a acontecer, entre outras possibilidades que sua imaginação pode te proporcionar.
Segue um exemplo de Bloco de Cenas Potenciais da mesma personagem do Diário de Progressão:
https://drive.google.com/file/d/1eg_cF4gQs2o1GxxvPZ3BjQ2Ag79LRbl2/view?usp=share_link
O mais interessante em ter um Bloco de Cenas Potenciais é que você não fica dependente do improviso ou de uma inspiração do momento e pode apenas perceber quando for um momento oportuno para trazer estas cenas à tona. Lembrando que qualquer aspecto definido pode ser alterado no improviso caso uma oportunidade similar ou até melhor apareça. Ter ideias de cenas preparadas não te impede de improvisar cenas não pensadas, muito pelo contrário, como você já tem possibilidades na sua mente, o que te deixará mais tranquilo, é mais provável que você consiga improvisar melhor, pois a melhor forma de se permitir ter segurança para improvisar é estar preparado e com potenciais narrativos latentes no seu inconsciente.
Outro ponto importante em se ressaltar sobre Cenas Potenciais é que você não precisa correr para que elas aconteçam, e algumas delas podem nunca vir a acontecer, e está tudo bem. Lembre sempre que são possibilidades e não uma obrigação. Além disso, perceba que a cada sessão é possível que você consiga encontrar espaço para apenas uma dessas cenas apenas, pois como o RPG é uma narrativa compartilhada os outros jogadores e a mestre também precisam de espaço para desenvolver suas ideias e cenas. Ou seja, evite correr com as suas e acabar limitando o espaço de ação do resto do grupo.
Conclusão
Espero que estas ideias e exemplos possam ampliar ainda mais seu repertório e te permitir contribuir com a narrativa a partir de cenas interessantes e criativas. Lembre também que quanto mais referência você tiver de todos os tipos de matérias, artes e jogos, mais fácil será criar. E não tenha medo de replicar uma cena que você viu em alguma outra obra que faz sentido com a sua mesa, pois o RPG é um jogo que permite a reutilização de ideias e a mistura de conceitos de forma livre e saudável. É mais importante ser criativo e se divertir do que ser “original” e ficar limitado nisso.
Bons jogos e boas histórias pra você!
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A PREPARAÇÃO DO JOGADOR – Parte 1
Por Maurício Fülber
Como Influenciar Ativamente a Narrativa com sua Personagem
Afinal de contas, o que é Roleplay?
É comum utilizarmos a palavra Roleplay como sinônimo de interpretação e de atuação, nos referindo principalmente a parte do jogo que acontece espontaneamente e de forma improvisada através dos diálogos entre as personagens do grupo e dessas com os PNJs apresentados pela Mestre/Guia/Narradora.
Entretanto, apenas ter personagens conversando sobre trivialidades aleatórias e debatendo o que fazer a seguir pode ser até divertido mas não cria, necessariamente, conexão emocional entre elas e nem desenvolve uma história mais profunda no sentido narrativo.
Não que isso seja uma regra, existem mesas onde a letalidade e a troca de personagens é tão constante que o jogo em si é mais um grande desafio de sobrevivência do que uma construção de narrativa interpessoal compartilhada. Nesse caso, o foco principal se apresenta na solução criativa de obstáculos e conflitos, com um foco secundário no desenvolvimento das personagens e em suas inter relações. E é sempre bom lembrar que não existe uma forma errada de se jogar RPG, apenas formas diferentes que servem a propósitos diferentes e a grupos com expectativas diferentes.
Mas imaginemos que o seu grupo está jogando com uma expectativa alta neste aspecto do que chamamos de Roleplay em uma narrativa que tem como foco as personagens dos jogadores e sua influência heroica no mundo que habitam. Como fazer com que essa expectativa se concretize no jogo?
Levando em consideração que nossas principais referências de alto nível em Roleplay vem, principalmente, de streams onde os jogadores são profissionais no improviso e na utilização da voz, acabamos com a sensação de que há uma barreira para que possamos ter uma performance consistente em nossos jogos casuais.
Porém, nosso equívoco é achar que é a performance, a atuação propriamente dita, que faz com que o que vemos nessas streams sejam interessantes quando, na verdade, outro ponto é ainda mais importante e nos escapa à primeira vista: a dramaturgia.
Pode parecer curioso trazer um termo naturalmente associado ao teatro para um debate sobre RPG, mas é importante entender que dramaturgia tem muito mais a ver com a construção de uma ideia narrativa do que de um roteiro rígido a ser seguido. Construir uma dramaturgia durante o jogo tem muito mais relação com o impulso inicial das cenas e o desenrolar das situações e suas consequências do que com uma escrita rígida prévia.
Ainda assim, uma boa dramaturgia que aconteça espontaneamente pode ganhar muito com jogadores que estejam preparados para reagir coerentemente com suas personagens a essas situações e, mais interessante ainda, que sejam capazes de criá-las.
Os Jogadores como Micronarradores
Primeiramente, deixemos claro que estamos nos referindo aqui a um modelo Simulacionista, onde as mecânicas buscam representar o que seria a “realidade” do mundo do jogo, como se os jogadores realmente fossem as personagens, interpretando elas da melhor e mais coerente maneira possível, em contraponto ao modelo Narrativista, onde as mecânicas buscam instigar todos que estejam jogando a contribuir com ideias que modificam diretamente a narrativa e os acontecimentos.
Nessa perspectiva Simulacionista, a qual estamos abordando neste artigo, a Mestre costuma ser responsável pela criação da Macronarrativa, ou seja, do mundo, seus habitantes, os desafios e tudo aquilo com o que as personagens irão interagir. Enquanto isso, os Jogadores são responsáveis pelas Micronarrativas que são, principalmente, a relação entre as personagens do grupo e suas ações no mundo.
Ou seja, no modelo Simulacionista os jogadores reagem a Macronarrativa a partir de suas personagens, tendo um espaço maior de ação no espectro da Micronarrativa, enquanto no modelo Narrativista os jogadores contribuem para a Macronarrativa diretamente.
Dito isso, imaginemos inicialmente a situação da Mestre, que precisa se preparar para diferentes situações que podem vir a acontecer durante uma sessão. Ela não pode decidir o que cada jogador irá fazer e, muitas vezes, sequer sabe para onde eles irão no próximo momento. Pensando nisso, ela se prepara para diferentes possibilidades de situações para poder manter o fluxo da sessão sem ser pega totalmente desprevenida. E é aqui que normalmente há a divisão entre a perspectiva de Mestrar e de Jogar.
Se ao mestrar há essa necessidade de preparação prévia para que o jogo possa fluir de forma agradável, porque ao jogar nós negligenciamos esse aspecto e nos apoiamos unicamente na reação improvisada aquilo que foi jogado em nós ou que aparece no nosso caminho?
E se nos propusermos, como jogadores, a antecipar situações a partir da relação entre as personagens do nosso grupo e as personagens que habitam o mundo em que jogamos, imaginando formas de interagir e movimentar a narrativa para além dos objetivos e missões, construindo cenas significativas que possam firmar os laços entre as diversas personagens que existem no mundo do jogo e, principalmente, entre o grupo do qual você faz parte?
Na próxima parte deste artigo iremos aprofundar técnicas para jogadores se prepararem para executar essas ideias de forma organizada. Até a próxima!
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Começando a narrar Savage Worlds
Por Daniel Tschiedel
Savage Worlds é um jogo de RPG de ação “genérico”, ou seja, sem um cenário fixo, de forma que possa ser usado para se jogar usando a temática de sua preferência. Ele casa muito bem com fantasia medieval, ficção científica, super heróis, guerras históricas ou até mesmo tempos atuais.
Para que isso seja possível, ele fornece um conjunto de regras que vão desde o básico como a criação de personagens (incluindo como criar suas próprias raças fantásticas), testes de atributos e perícias, combate e poderes, até maiores granularidades, como situações específicas, combates em massa, perseguições etc.
Quem abre o livro básico do Savage Worlds Edição Aventura (a versão mais recente do jogo) e inicia sua leitura pode se sentir intimidado pela quantidade de regras e conteúdo que ele possui. Mas não se assuste. Começar a narrar Savage Worlds é mais simples do que parece, e ele, inclusive, traz algumas mecânicas que facilitam a vida do Mestre, como as regras de extras e a contagem de ferimentos.
Por onde começar
A parte mais importante do jogo e seu verdadeiro coração se encontram nas páginas 101 a 112 do Capítulo 3: Regras, do livro básico do Savage Worlds Edição Aventura. Ali há toda a explicação dos conceitos principais do jogo, como o que são cartas selvagens e extras, benes, áses, ampliações etc.
Além disso, ali estão contidas todas as regras para testes de características (atributos e perícias), bem como as regras de combate, com a explicação da iniciativa, como fazer ataques e como funcionam os ferimentos e a cura no jogo.
Dominando-se essa parte básica, já é possível narrar Savage Worlds. Não se preocupe por enquanto com as Regras Situacionais e as diversas manobras de combate. É possível improvisar a maior parte dessas situações apenas aplicando modificadores aos testes (-4, -2, +2 ou +4) ou através de testes resistidos.
Por exemplo, se houver algo que possa dificultar o ataque de um personagem, como haver algum obstáculo, aplique uma penalidade de -2 na rolagem do atacante, e caso seja algo que atrapalhe muito, aplique uma penalidade de -4.
Outro exemplo, seriam as manobras de combate. Se um personagem quiser desarmar outro, simplesmente aplique uma rolagem resistida de uma característica que se achar adequada, como ambos simplesmente fazerem uma rolagem da perícia Lutar.
O baralho de iniciativa
A regra de iniciativa do Savage Worlds é bastante peculiar e pode parecer tentador simplesmente ignorá-la e usar regras de iniciativas de outros jogos. Mas, por favor, não faça isso logo de cara. Tente jogar usando a regra como ela é, vale a pena.
Ela facilita muito o controle da ordem dos turnos com as cartas na mesa, além de ser empolgante toda vez que alguém saca um Curinga. Mas caso queira agilizar mais a iniciativa do jogo, basta usar a regra para Grupos Grandes, onde basicamente apenas duas cartas são sacadas, uma para os antagonistas e outra para os protagonistas, definindo qual grupo agirá primeiro.
Inimigos Rápidos
O livro de Savage Worlds Edição Aventura já vem com um enorme bestiário, recheado de inimigos que você pode escolher e usar em suas aventuras. Porém há momentos em que acaba sendo necessário improvisar um inimigo na hora. Apesar das fichas das criaturas não possuírem estatísticas complexas, pode ser um pouco trabalhoso criar um oponente do zero, distribuindo seus atributos, perícias e habilidades especiais.
Uma forma simples de se criar inimigos rapidamente (principalmente extras), é atribuir um valor de dado para todas as suas características. Para o dano, considere como sendo 2x o dado escolhido. A movimentação é 6 por padrão (incremente caso queira) e o valor de Aparar e Resistência são calculados conforme as regras básicas. Ou seja, um inimigo d4, terá d4 em todos os atributos e perícias, aparar 4 e resistência 4 (mais qualquer armadura que tiver), 2d4 de dano, e assim por diante.
Caso seja necessário tornar um inimigo mais mortal (como o lobo líder de uma matilha), basta transformá-lo em uma carta selvagem. Só o fato dele ter o dado selvagem, benes adicionais e poder suportar 3 ferimentos, já o torna uma ameaça perigosa.
Finalizando
Como visto, é possível começar a narrar Savage Worlds sabendo-se apenas o básico das regras e improvisando o resto. Não tenha pressa e inclua as demais regras conforme vá se sentindo confortável com o sistema.
E caso queira experimentar o jogo antes de comprá-lo, basta fazer o download gratuito do Test Drive na seção de Downloads aqui do site. Ele possui tudo que você precisa para jogar, como as regras básicas, uma aventura e personagens prontos. Boas rolagens!
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Aquele Corpo que Habitava o Céu
Por Tchelo Andrade
Se você é um homem solitário morando em uma cidade do interior e não se interessa por fofocas, sua vida pode estar destinada ao tédio. O mundo está em guerra pela segunda vez e as pessoas da vila em que moro só se interessam em saber se a vizinha dorme com alguém além de seu próprio marido. O boteco da cidade não me convence, por mais que o álcool tenha sido muito útil nesses últimos meses; na ausência de elementos que poderia dar uma vida decente a um cidadão comum, sobraria os jogos – entretanto, fora a minha recente experiência com jogos de azar e uma dívida exorbitante que me fizeram fugir da capital para me esconder nesse fim de mundo.
Agarrado ao tédio, só me restava dia após dia encontrar uma forma diferente de passatempo. Quando as atividades mundanas já não me eram atrativas, minha visão recorreu ao céu e em uma noite estrelada minha visão ordinária se alterou para sempre.
Foi então que eu a vi.
E ela se entregou para mim.
Sinuosa no céu, com contornos singulares, uma pureza e uma doçura visual ímpar, aquele corpo que habitava o céu ansiava se entregar para mim. Eu tinha certeza.
Era uma estrela como nenhuma outra.
Durante o dia, passei a tomar notas e aprender mais sobre astronomia – é comum nós galanteadores aprendermos mais sobre a dama que pretendemos cortejar. – Enquanto a noite não chegava, os livros me faziam companhia, eu queria saber qual era o nome daquela estrela. Contudo, os livros que encontrei na biblioteca local, tinham baixo rigor acadêmico e sobre aquele corpo celeste nada constavam. Então, tomei para mim a responsabilidade de lhe dar um nome.
Como eu deveria chamá-la?
De Amada, obviamente. Minha Amada.
Da janela do meu quarto, eu me felicitava com o prazer de admirar os contornos cintilantes e incandescentes de minha amada no céu. Para mim, quanto mais eu me entregava a ela, mais ela se tornara vibrante – e tal fato era o bastante para entender que meu amor era correspondido. E no enlace dessa paixão cósmica, os dias se tornarão cada vez menos importantes para mim, uma vez que me acostumei a dormir durante todo o tempo que não houvessem estrelas no céu. Graças a isso, minha visão se elevou e eu passei a ver ainda mais detalhes daquela volúpia. Incluindo, descobrir seu segredo: aquele corpo que habitava o céu, estava cada vez mais próximo.
Tomando por um êxtase que combinava ansiedade e prazer, eu comemorei no meu quarto abafado. Minha amada estava vindo até mim. Nem mesmo as barreiras dos anos luz, poderiam impedir a ascensão de nosso amor.
Assim, buscando um espaço mais amplo, tomei uma decisão. Iria para o telhado! Lá nenhum poste desgraçado atrapalharia a profundidade de campo. Comecei a me mover pela janela, agarrei a grande e os canos. Lá em cima, fui cuidadoso – se a proprietária da vila soubesse de minha pequena aventura, ela certamente me advertiria e eu estarei nas rodas de fofocas, mencionado como tarado ou ladrão. – Para um fugitivo, a discrição é importante, mesmo assim, ousei e alcancei o ponto mais alto da casa em silêncio.
Não sei você, mas eu sou do tipo que sempre guarda o melhor para o final e muitas vezes eu evito tomar algo bom para mim, apenas com medo desse algo acabar de forma súbita. Foi assim que me encontrei no alto daquele sobrado. De onde estava, parecia que eu podia tocar a minha estrela favorita, mas por um bocado de segundos eu hesitei, não queria que aquele momento de perscrutação chegasse ao fim. Até que ele chegou. Estiquei minha mão esquerda, já que o braço direito ainda doía bastante – efeito colateral da surra que levei para pagar meus débitos, quando ainda morava na capital.
Quando minha mão alcançou a plenitude do céu noturno, meu passado não importava mais, pois foi como se o tempo tivesse parado… afinal, eu podia sentir a maciez de vênus.
Eu podia tocar a estrela. Literalmente.
E não apenas ela.
Eu podia tocar o céu também.
E todo meu delírio se transformara em desespero. Dei-me conta que o céu, era feito de uma espécie de vidro e que a minha Amada, aquele corpo que habitava o céu, na verdade não era uma estrela, era uma lâmpada. Inferno! O que diabos estava acontecendo? Tomado por uma raiva, eu bati com toda minha força contra o vidro e uma rachadura se formou. Forcei ainda mais e um buraco surgiu, um vão por onde um homem adulto e magro como eu passaria facilmente.
Cuidadosamente espiei pela abertura, havia muita luz no ambiente acima. Eu realmente rompera o céu? Estava curioso para saber o que encontraria além dali, mas antes de o fazê-lo, me contive, retornei ao meu aposento fétido e escrevi essas notas rápidas. Escrevo, pois temo que meu retorno não seja definitivo e se você não tomar conhecimento do meu paradeiro, faça de mim um exemplo e sempre, sempre pague os seus débitos.
Nunca se sabe para quais deuses rezam seus credores.
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Regras existem para ser adaptadas
Por Fábio Sapragonas
Se você está aqui (no site) é porque está interessado em RPG. Como todo jogo, o RPG tem regras, as quais servem para dimensionar o que e como é possível jogar. O que dá ao RPG uma complexidade própria são justamente as camadas de regras.
Uma camada possível é a das regras que normatizam e dão as dimensões das possibilidades de ação, do que e como é possível fazer em um mundo. Cada jogo de RPG disponível no mercado é um conjunto de regras que com frequência se articula a um cenário ou um mundo. Há também os RPGs genéricos, aqueles que apresentam um conjunto de regras sem um cenário definido, pois pode ser aplicado para diferentes cenários. No entanto, mesmo nesses casos, o sistema, ao apresentar suas regras, cria uma forma de funcionamento, de economia de ações e de mecânicas de jogo que dimensionam as possibilidades.
O RPG é também um jogo de interpretação, o que dá a ele outra camada. As regras não são somente sobre as possibilidades do que um jogador pode fazer, mas também sobre quem ou o quê o jogador pode ser, o que também determina as formas de ele agir no mundo. E isso está ligado a como aquele personagem pode ser, ou seja, fornece um espaço possível de como o jogador pode interpretá-lo.
Como já deve estar claro, essas duas camadas estão ligadas e é justamente essa interdependência delas que faz o jogo do RPG único. Seu personagem não pode fazer tudo em um mundo, uma vez que está limitado pelas suas habilidades, as quais também não são apenas o quê ele pode fazer, mas também orientam como e por que ele fará.
Porém, nenhum sistema é uma obra finalizada. Todo livro de RPG que você adquire, uma vez seu, torna-se uma obra coletiva sua com os autores. Você pode criar – e com frequência será levado a isso – características e fatos para esse mundo. Você pode também definir novas formas de funcionamento das mecânicas, pois, às vezes, o livro não é explícito ou direto sobre como resolver alguma questão que surge na mesa de jogo. Você e seus amigos de mesa podem, ainda, achar que alguma regra não reflete bem ou não dá conta de toda a complexidade de alguma ação ou jogada possível. Em outras palavras: em algum momento, vocês terão que mudar ou criar regras para o seu jogo. E, sim, essa decisão normalmente é coletiva, pois todos são participantes e “vivem” naquele mundo.
Uma fonte valiosa para pensar regras novas é a experiência de vocês com outros sistemas. Outros jogos de RPG podem ser usados como inspiração ou mesmo de onde se pode “roubar” regras. Contudo, é importante ter cuidados. O principal deles se refere ao que já dissemos: parte das regras de um sistema diz respeito à construção de um mundo, de um cenário e dos personagens. Ou seja, as regras emprestadas precisam, na maior parte das vezes, de adaptações, caso contrário, podem descaracterizar o mundo, o cenário e os personagens.
Considere um jogo como o de Rastro de Cthulhu (RdC), no qual deve existir uma sensação de incerteza, perigo e ameaça constantes. Agora, pense em uma mecânica como os benes de Savage World. Os benes são benefícios que certos personagens (dos jogadores ou do mestre) iniciam em uma mesa ou podem adquirir conforme seu desempenho. Os benefícios podem ser a oportunidade de rolar novamente um dado, de absorver ou rerrolar um dano, de pedir uma dica para o mestre ou de improvisar um item que ajude a resolver algum problema. Então, cabe uma questão: seria possível usar a mecânica de benes no sistema de RdC? Depende da história que vocês querem contar e vivenciar.
Imagine uma história de RdC estilo pulp em que há um assassino tomado por alguma força sobrenatural que o faz capaz de resistir a tiros, golpes dos mais diversos tipos de armas (inclusive improvisadas), quedas, fogo, eletricidade e tudo mais que causaria um dano considerável a um ser humano comum. Uma forma de representar essa resiliência dos “heróis” de filmes slasher seriam os benes. Ou seja, o guardião não anunciaria que possui benes e, após usar o primeiro, esconderia quantos possui, o que contribuiria para o aumento da tensão para os jogadores, já que, a qualquer momento, o assassino pode ignorar uma parte do dano sofrido ou dar um golpe mortal.
Os benes também podem ser usados pelos jogadores, porque, nesse tipo de história, sempre tem um jovem que sobrevive a uma machadada no bucho e que volta para salvar o grupo ou que consegue pensar ou encontrar uma solução para vencer o “monstro”. O ideal seria não distribuir muitos benes, talvez um para o grupo todo ou um para cada jogador, pois um assassino cruel dificilmente daria uma segunda chance para suas vítimas.
O Rastro também tem uma premissa muito boa, própria do sistema Gumshoe: o importante não é achar as pistas, mas as interpretar. Ou seja, é um foco maior na interpretação e na experiência da história do que em mecânicas de como achar as informações que permitem avançar na aventura. Essa é uma “regra” bastante útil para usar em outros sistemas quando vocês estão mais preocupados com a história.
É frustrante para todo mundo quando os jogadores chegam a uma determinada situação ou cena e, por alguma rolagem mal sucedida ou pela falta de alguma perícia específica, não conseguem avançar. Caso algo assim aconteça, nada impede que o narrador use alguma perícia como sinergia ou mesmo disfarce uma rolagem dos jogadores para revelar a informação necessária para que eles possam avançar na aventura.
Nesse sentido, cabe valorizar mais as capacidades interpretativas e de como os jogadores podem e conseguem usar suas habilidades de personagem não só como mecânicas de jogo, mas também como suportes interpretativos para que descubram um pista determinada, ou percebam aquele cara estranho sentado na mesa do fundo, pois, o mais importante, não é perceber o sujeito, mas ouvir o que ele tem a dizer.
Nenhum sistema é obra fechada, pois o jogo de RPG é dinâmico e essa dinâmica se reflete sobre as regras. Não tenha medo de adaptar regras, buscar soluções em outros jogos e remontar seu sistema preferido.
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