Por Maurício Fülber

Como Influenciar Ativamente a Narrativa com sua Personagem

Afinal de contas, o que é Roleplay?

É comum utilizarmos a palavra Roleplay como sinônimo de interpretação e de atuação, nos referindo principalmente a parte do jogo que acontece espontaneamente e de forma improvisada através dos diálogos entre as personagens do grupo e dessas com os PNJs apresentados pela Mestre/Guia/Narradora.

Entretanto, apenas ter personagens conversando sobre trivialidades aleatórias e debatendo o que fazer a seguir pode ser até divertido mas não cria, necessariamente, conexão emocional entre elas e nem desenvolve uma história mais profunda no sentido narrativo.

Não que isso seja uma regra, existem mesas onde a letalidade e a troca de personagens é tão constante que o jogo em si é mais um grande desafio de sobrevivência do que uma construção de narrativa interpessoal compartilhada. Nesse caso, o foco principal se apresenta na solução criativa de obstáculos e conflitos, com um foco secundário no desenvolvimento das personagens e em suas inter relações. E é sempre bom lembrar que não existe uma forma errada de se jogar RPG, apenas formas diferentes que servem a propósitos diferentes e a grupos com expectativas diferentes.

Mas imaginemos que o seu grupo está jogando com uma expectativa alta neste aspecto do que chamamos de Roleplay em uma narrativa que tem como foco as personagens dos jogadores e sua influência heroica no mundo que habitam. Como fazer com que essa expectativa se concretize no jogo?

Levando em consideração que nossas principais referências de alto nível em Roleplay vem, principalmente, de streams onde os jogadores são profissionais no improviso e na utilização da voz, acabamos com a sensação de que há uma barreira para que possamos ter uma performance consistente em nossos jogos casuais.

Porém, nosso equívoco é achar que é a performance, a atuação propriamente dita, que faz com que o que vemos nessas streams sejam interessantes quando, na verdade, outro ponto é ainda mais importante e nos escapa à primeira vista: a dramaturgia.

Pode parecer curioso trazer um termo naturalmente associado ao teatro para um debate sobre RPG, mas é importante entender que dramaturgia tem muito mais a ver com a construção de uma ideia narrativa do que de um roteiro rígido a ser seguido. Construir uma dramaturgia durante o jogo tem muito mais relação com o impulso inicial das cenas e o desenrolar das situações e suas consequências do que com uma escrita rígida prévia.

Ainda assim, uma boa dramaturgia que aconteça espontaneamente pode ganhar muito com jogadores que estejam preparados para reagir coerentemente com suas personagens a essas situações e, mais interessante ainda, que sejam capazes de criá-las.

Os Jogadores como Micronarradores

Primeiramente, deixemos claro que estamos nos referindo aqui a um modelo Simulacionista, onde as mecânicas buscam representar o que seria a “realidade” do mundo do jogo, como se os jogadores realmente fossem as personagens, interpretando elas da melhor e mais coerente maneira possível, em contraponto ao modelo Narrativista, onde as mecânicas buscam instigar todos que estejam jogando a contribuir com ideias que modificam diretamente a narrativa e os acontecimentos.

Nessa perspectiva Simulacionista, a qual estamos abordando neste artigo, a Mestre costuma ser responsável pela criação da Macronarrativa, ou seja, do mundo, seus habitantes, os desafios e tudo aquilo com o que as personagens irão interagir. Enquanto isso, os Jogadores são responsáveis pelas Micronarrativas que são, principalmente, a relação entre as personagens do grupo e suas ações no mundo.

Ou seja,  no modelo Simulacionista os jogadores reagem a Macronarrativa a partir de suas personagens, tendo um espaço maior de ação no espectro da Micronarrativa, enquanto no modelo Narrativista os jogadores contribuem para a Macronarrativa diretamente.

Dito isso, imaginemos inicialmente a situação da Mestre, que precisa se preparar para diferentes situações que podem vir a acontecer durante uma sessão. Ela não pode decidir o que cada jogador irá fazer e, muitas vezes, sequer sabe para onde eles irão no próximo momento. Pensando nisso, ela se prepara para diferentes possibilidades de situações para poder manter o fluxo da sessão sem ser pega totalmente desprevenida. E é aqui que normalmente há a divisão entre a perspectiva de Mestrar e de Jogar.

Se ao mestrar há essa necessidade de preparação prévia para que o jogo possa fluir de forma agradável, porque ao jogar nós negligenciamos esse aspecto e nos apoiamos unicamente na reação improvisada aquilo que foi jogado em nós ou que aparece no nosso caminho?

E se nos propusermos, como jogadores, a antecipar situações a partir da relação entre as personagens do nosso grupo e as personagens que habitam o mundo em que jogamos, imaginando formas de interagir e movimentar a narrativa para além dos objetivos e missões, construindo cenas significativas que possam firmar os laços entre as diversas personagens que existem no mundo do jogo e, principalmente, entre o grupo do qual você faz parte?

Na próxima parte deste artigo iremos aprofundar técnicas para jogadores se prepararem para executar essas ideias de forma organizada. Até a próxima!


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