Por Ivan Coluchi
Adaptações de séries, livros e filmes para jogos de RPG são muito comuns. Há várias aqui no site da Retropunk e na revista RolePunkers. Tudo que você assiste, lê ou ouve pode servir de inspiração para suas mesas de jogo e não há nada de errado em aproveitar enredos de obras de ficção em suas aventuras. Mas a vidareal também pode servir de inspiração.
Inspirado x Baseado x Adaptado
A diferença entre “inspirado em”, “baseado em” ou “adaptado de” é o grau de fidelidade com a história original. Uma adaptação tenta (mas nem sempre consegue) ser a mais fiel à história original. Algo “baseado em”, como o próprio nome já diz, usa o enredo original como base, mas cria ou explora outras ideias. Às vezes, a história é modernizada ou apresentada sob um ponto de vista diferente da original. Uma produção “inspirada em” só tem a história original como sugestão e pode resultar em algo muito diferente, talvez até irreconhecível.
Exemplos em jogos
Castelo Falkenstein é um exemplo de um jogo baseado no mundo real e na literatura vitoriana. A maioria dos países, tecnologia, personalidades e eventos apresentados no livro foram reais ou estão presentes em algum livro vitoriano. Mas o jogo só os usa como base para criar um cenário fictício, combinando esses eventos reais com coisas fantasiosas, como magias e fadas. Se você conhece o mundo real (e por que você não conheceria?), já está familiarizado com o mundo de Falkenstein.
O jogo Pradarias Ultravioletas e a Cidade Negra, por outro lado, apresenta um cenário inspirado em metal psicodélico, no gênero Dying Earth e nos jogos clássicos estilo Oregon Trail. Todos esses elementos influenciaram o autor, mas ele criou seu próprio cenário e não apenas uma reprodução dessas referências.
Tudo pode virar fantasia
O cenário do seu jogo não precisa ser uma versão alternativa do nosso mundo para que você use fatos reais como inspiração. Mesmo os jogos mais fantásticos e surreais podem usar fatos históricos para desenvolver um enredo próprio. Por exemplo, a máfia de Chicago na década de 1920 pode ser a inspiração para a sua guilda de ladrões em uma cidade de fantasia medieval. Troque o contrabando de bebidas pelo contrabando de poções mágicas, mude alguns nomes e, pronto, virou uma história de fantasia.
Spoiler
Um dos problemas de usar fatos históricos como inspiração é que eles são de conhecimento público, caso contrário, não seriam parte da História. Isso apresenta o risco do seu grupo de jogadores reconhecerem o enredo e prevêrem o rumo da aventura. Ao mesmo tempo que essas inspirações podem ser um easter egg divertido para revelar depois do final do jogo, se elas forem muito óbvias ou fiéis ao fato original, poderão ser facilmente identificadas. 
A não ser que você queira criar um paralelo óbvio com o mundo real, evite uma reprodução ao pé da letra dos fatos históricos. Mude nomes, locais, misture referências ou procure fontes mais obscuras. No exemplo acima, da guilda de ladrões inspirada na máfia, o mais óbvio seria usar Al Capone como molde para o líder da gangue. Porém, existiram muitos outros gangsters, menos conhecidos, que também podem servir de inspiração para seu líder ladino, como Ma Barker ou Lucky Luciano. 
Onde encontrar inspirações Documentários, em serviços de streaming ou no YouTube, podem ser fontes de referências. Se você já sabe qual será o tema da aventura, procure documentários de assunto relacionados. Por exemplo, séries de true crime podem inspirar suas aventuras de detetives em City of Mist.
Em jogos como Rastro de Cthulhu, que se passa em um período específico (década de 1930) , procure o ano ou a década na wikipédia para encontrar listas de eventos e personalidades desse período.
Se você ainda tem livros de história ou geopolitica da sua época de escola, dê uma folheada nas páginas. Talvez você relembre algum fato interessante que aprendeu e pode servir de inspiração.
Armadilhas históricas
A frase “a história é escrita pelos vencedores” é comumente atribuída ao escritor George Orwell. Ela expressa a imparcialidade dos relatos históricos, que muitas vezes, expõem ou omitem coisas de acordo com os preconceitos e convicções de quem os escreveu. Alguns relatos reproduzem preconceitos da época em que foram escritos sem refletir sobre eles, ou simplesmente ignoram perspectivas diferentes, porém relevantes, sobre o mesmo fato.
Ao buscar histórias reais para usar como inspiração em sua mesa de jogo, não esqueça de usar seu pensamento crítico. Tome cuidado para não reproduzir preconceitos ou visões errôneas que foram escritas no passado.
E lembre-se de que seu jogo não precisa ter a responsabilidade de reproduzir fatos históricos. Essa busca por autenticidade histórica pode acabar privando os jogadores de agenciamento. Use fatos reais como inspiração, mas não deixe que eles limitem sua diversão e criatividade.


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